quarta-feira, 24 de abril de 2013

MINIMA ALTERAÇÃO HORMONAL EM UM PACIENTE COM GRANDE FEOCROMOCITOMA.


    MÍNIMAS ALTERACÕES HORMONAIS EM UM PACIENTE COM GRANDE FEOCROMOCITOMA

    INTRODUÇÃO
    Os feocromocitomas e paragangliomas representam aproximadamente 0,20/0 dos casos de hipertensão arterial sistêmica. Os feocromocitomas grandes podem apresentar poucos sintomas e pequenas elevações das catecolaminas, pois podem metabolizar dentro do próprio tumor. Muito raramente (em cerca de 3% dos casos) estes tumores não modificam nenhum teste laboratorial ou minimamente alteram os metabólitos urinários.
    RELATO DE CASO
    EESP, 31anos, sexo masculino, marceneiro, casado, natural e procedente de Recife-Pe procurou nosso serviço referindo que em 1993 apresentou uma crise de dor 1ombar esquerda, com irradiação para hipogástrio, que cedeu com o uso de analgésicos. Dois anos depois voltou a ter novo episódio de dor 1ombar, desta vez acompanhado de cefaléia, hipertensão arterial, rubor facial, sudorese e palidez cutânea. Em maio de 1996, o quadro se repetiu, com presença de arritmia cardíaca e hipertensão arterial sustentada, sendo internado no Hospital dos Servidores do Estado. Durante o internamento , evoluiu com crise convulsiva, sendo prescrito fenobarbital 100 mg/dia (Gardenal (B) 100mg).
    * Antecedentes pessoais :
    Refere asma brônquica (há aproximadamente 6 anos sem crise): banhos no Rio Beberibe.

    * Antecedentes familiares:
    Mãe hipertensa teve acidente vascular cerebral hemorrágico (AVCH) há 3 anos devido a aneurisma cerebral. Pai portador de gastrite.

    Ao exame físico encontrava-se com estado geral regular, consciente, eupnéico, acianótico, anictérico, taquicárdico (FC=120 bpm), com ritmo cardíaco regular e pressão arterial de 160 x 100 mmHg. Ausculta pulmonar e exame do abdome não apresentavam alterações ao exame.Os exames laboratoriais e de imagem encontram-se nas tabelas 1 e 2.
    Tabela 1
    EXAMERESULTADOVALOR NORMAL
    Glicose, uréia,
    creatinina, ionograma,
    coagulograma, hemograma
    Normais-
    VMA37,0 mMol/24haté 35 mMol/24h
    Catecolaminas plasmáticas
    epinefrina
    norepinefrina
    dopamina

    33,7 pg/ml
    176,9 pg/ml
    14,5 pg/ml

    <140 pg/ml
    <1400 pg/ml
    <30 pg/ml
    Metanefrinas urináriasnormetanefrina
    metanefrina

    0,21 mg/g de creatinina
    0,01 mg/g de creatinina

    <0,41 mg/g de creatinina
    <0,30 mg/g de creatinina
    Tabela 2 - Exames de imagem.

    EXAMERESULTADO
    Tomografia Computadorizada de abdome e pelve (agosto de 1995)Massa de crescimento agressivo medindo 9,0 x 8,0 cm, com áreas de provável necrose central envolvendo a região de adrenal e polo superior do rim esquerdo, invadindo e promovendo deformidade na prção superior deste rim.
    Ultrassonografia de aparelho urinário e adrenais (maio de 1996)massa sólida, heterogenea, com área cística central (necrose? hemorragia?), medindo 15 x 9,0 cm, localizada em flanco esquerdo, desviando a aorta medialmente e a cauda pancreática anteriormente.
    Cintilografia de corpo inteiro com MIBG -IFormação expansiva de contornos irregulares e limites relativamente precisos, situada em projeção do polo superiro do rim esquerdo e que apresenta área de hipocaptação local em seu aspecto súpero-lateral que deve corresponder a área de necrose tumoral.
    EcocardiogramaFração de ejeção de 71%, demais dados também normais.


    Foi feita a hipótese diagnóstica de feocromocitoma, sendo o paciente submetido ao preparo pré-operatório, usando prazosin (5 mg/dia) e atenolol (100 mg/dia), dieta e hidratação. Durante a cirurgia foi detectada invasão tumoral do rim esquerdo, sendo feitas exérese de tumor adrenal e nefrectomia esquerda. Para controle da pressão arterial foram, utilizadas, durante a cirurgia, aproximadamente 8 litros de solução salina e 3 ampolas de nitroprussiato de sódio (Nipride). Foi enviada para patologia uma peça cirúrgica correspondente ao rim esquerdo aderido pelo pólo superior a uma massa tumoral ovalada, aparentemente encapsulada, acastanhada e firme-elástica, medindo 11,0 x 10,0 x 9,0 cm e pesando 550g, com área central cística, de aspecto gelatinoso. A microscopia mostrou neoplasia adrenal (feocromocitoma) e parênquima renal com glomérulos com celularidade conservada e congestão medular .
    DISCUSSÃO
    Uma vez feita a suspeita clínica de feocromocitoma, testes bioquímicos podem estabelecer o diagnóstico em mais de 95% dos pacientes. Dos vários testes bioquímicos, as catecolaminas plasmáticas e urinárias e as metanefrinas urinárias parecem ter a maior sensibilidade e o VMA, a menor. Os exames com coletas urinárias têm o inconveniente da baixa aderência para a coleta de 24 horas, apesar dos esforços do paciente e de seus familiares.
    Cromogranina A sérica tem sido sugerida como uma alternativa para as catecolaminas plasmáticas, pois suas medidas são pouco influenciadas por drogas comumente usadas no tratamento do feocromocitoma. Tem uma boa sensibilidade, porém a especificidade não é boa, principalmente devido a sua excreção renal (insuficiência renal moderada pode levar a significantes aumentos nos níveis séricos).
    Os testes farmacológicos (clonidina, glucagon) podem ser realizados quando o diagnóstico não é óbvio, tendo a finalidade de separar os pacientes com feocromocitoma daqueles com atividade simpática elevada.
    Das técnicas de imagem, a TC e a RNM são igualmente sensíveis (98 e 100% respectivamente), enquanto que a cintilografia com MIBG-1131 tem sensibilidade de apenas 78%, mas com uma especificidade de 100% (70 e 67% da TC e da RNM, respectivamente). A cintilografia com MIBG1131 além de dar a localização anatômica, orienta sobre a caracterização funcional do tumor.
    A elevação da pressão arterial é a mais consistente manifestação do feocromocitoma. Contudo, a hipertensão é sustentada em apenas metade de todos os pacientes, sendo paroxística em um terço e não existente em um quinto dos casos. Nosso paciente apresentava hipertensão sustentada, apesar dos níveis normais de catecolaminas plasmáticas.
    Necrose hemorrágica aguda do tumor pode se apresentar como um quadro de abdome agudo associado com marcada hipertensão arterial seguida de hipotensão e até choque e morte súbita (como conseqüência da marcada dilatação venosa e arterial decorrente da rápida diminuição das catecolaminas plasmáticas. O paciente descrito aqui já tinha, ao diagnóstico, área cística central compatível com necrose tumoral e relatava um episódio de dor abdominal aguda que poderia ter sido decorrente do desenvolvimento desta necrose.
    O fato das catecolaminas plasmáticas estarem normais poderia ser explicado tanto pela presença de necrose tumoral, fazendo com que a produção e liberação das catecolaminas fossem diminuídas, como pelo grande tamanho do tumor, fazendo com que as mesmas fossem metabolizadas dentro do próprio tumor.
    Pequenos tumores (<50g) tendem a produzir mais sintomas e são melhor diagnosticados pela medida das catecolaminas plasmáticas. Já os tumores grandes (>50g) metabolizam mais as catecolaminas, apresentando o paciente menos sintomatologia, catecolaminas plasmáticas mais baixas e metabólitos urinários mais elevados.
    O grande tamanho do tumor e sua extensão local no tempo da cirurgia são fatores prognósticos de malignidade. Porém não houve invasão local (o rim não mostrou invasão tumoral), falando a favor de benignidade, apesar de evidências de malignidade poderem ocorrer anos após a excisão cirúrgica de um tumor aparentemente benigno (média de 5,6 anos). Áreas mais comuns de metástases (linfonodos, osso, pulmão e fígado) não se mostraram acometidas.
    Em conclusão, este caso ilustra uma apresentação atípica do feocromocitoma.

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