sábado, 26 de janeiro de 2013


DIAGNÓSTICO TOPOGRÁFICO
A decisão quanto à abordagem cirúrgica do feocromocitoma depende da localização do tumor e não deve ser tomada antes de se obter uma evidência radiológica do tumor, já que este pode ser múltiplo ou estar localizado em posições extra-adrenais. Como os feocromocitomas são em geral tumores grandes, a sua identificação, com a utilização dos métodos radiológicos atuais, não é problemática, exceto nos casos de tumores situados em localizações incomuns.
Os métodos mais freqüentemente utilizados na identificação topográfica do feocromocitoma são tomografia computadorizada (TC), ressonância magnética (RM) e mapeamento de corpo inteiro com 131I-meta-iodo-benzil-guanidina (131I-MIBG). Os dois primeiros são exames extremamente sensíveis na detecção dos tumores adrenais, mas a RM é superior na localização dos extra-adrenais, principalmente os intra-cardíacos (96,97). O problema dos dois exames é a especificidade, que não é de 100%, embora seja superior na RM. A presença de tumor adrenal em paciente com diagnóstico bioquímico positivo não identifica necessariamente o feocromocitoma, já que poderíamos estar diante de um incidentaloma. O exame de RM tem uma especificidade maior do que a TC, porque o tumor tipicamente exibe um brilho intenso nas imagens em T2, embora isto nem sempre ocorra; outra vantagem da RM sobre a TC, além da especificidade, é a de que ela é mais sensível na identificação de tumores extra-adrenais e é um exame que pode ser realizado em gestantes (75,76). A meta-iodo-benzil-guanidina, pela sua semelhança estrutural com a NA, é captada e concentrada nas vesículas adrenérgicas e, após a administração do composto marcado (131I-MIBG), o mapeamento demonstra imagens em áreas onde houver grande concentração de vesículas adrenérgicas (75,76,98,99). A vantagem do mapeamento sobre a TC e a RM é a de que o primeiro exame fornece um dado funcional, além do anatômico, e, portanto, é um método mais específico; ocasionalmente, o método se mostra mais sensível na detecção de tumores pequenos (< 2cm) e multifocais, nem sempre revelados pela TC. Dessa forma, o mapeamento de corpo inteiro com 131I-MIBG pode facilitar o diagnóstico de feocromocitomas extra-adrenais e de lesões metastáticas (75,76,98,100-102). Estudos com 123I-MIBG têm revelado superioridade deste material na identificação do tumor, principalmente daqueles em localizações não comuns, recorrentes ou metastáticos, mas atualmente apenas o composto 131I-MIBG é disponível comercialmente (103,104). Outros agentes que já foram utilizados em imagens de tomografia com emissão de positron (PET) são18F-fluordeoxiglicose (FDG-PET) e 11C-hidroxiefedrina, e a experiência com esses compostos tem sido promissora (105-107). Mais recentemente, a literatura tem sugerido o uso da PET com 6-[18F]-fluordopamina para identificação de metástase de feocromocitoma (108). Embora o FDG-PET possa ser usado rotineiramente em vários serviços, o PET com 11C-hidroxiefedrina ou 6-[18F]-fluordopamina só é disponível em alguns centros especializados.
Na identificação topográfica do tumor, devemos lembrar que, embora o feocromocitoma seja um tumor adrenal em 90% dos pacientes, ele pode se apresentar em localizações extra-adrenais desde a base do crânio até a pelve (109-111). Estudo recente que relata a experiência da Mayo Clinic com 236 pacientes portadores de 297 paragangliomas benignos revela que 69% está localizado na cabeça e pescoço, 21,5% está localizado no abdomen (a maioria em regiões periaórticas, pericavais, perirrenais e no orgão de Zuckerkandl) e 9,5% está no tórax (mediastino, intracardíaco e no parênquima pulmonar). A maioria dos tumores funcionantes está localizada no abdome, uma fração menor no mediastino ou coração, e os tumores da cabeça e pescoço são raramente (4%) produtores de catecolaminas. A RM foi o método mais sensível no dignóstico, e a MIBG, embora seja o método menos sensível, é altamente específico e pode ser a única imagem positiva em alguns casos de paragangliomas. Esses tumores podem ser múltiplos, sincrônicos ou assincrônicos, e, em função disso, o seguimento dos pacientes deve ser feito a longo prazo (112).
Outro ponto que devemos ter em mente é que os tumores adrenais podem ser bilaterais, principalmente nos pacientes com síndromes genéticas. Esses tumores não são necessariamente sincrônicos, isto é, um pode preceder o outro e pacientes com essas síndromes e feocromocitoma unilateral devem ser acompanhados durante toda a vida com o objetivo de se detectar o aparecimento de tumor contralateral.
A observação geral demonstra que os tumores esporádicos são, na maioria das vezes, únicos e situados nas adrenais direita ou esquerda; muito raramente eles são múltiplos ou bilaterais, e em 10 a 15% dos pacientes eles são extra-adrenais. Na NEM2, os tumores freqüentemente são bilaterais, mas podem ser unilaterais e excepcionalmente esses pacientes possuem tumores extra-adrenais. Na síndrome VHL, os tumores são em geral bilaterais, mas é interessante chamar a atenção para maior chance de tumores extra-adrenais. Nos pacientes com paraganglioma familiar, a multiplicidade do tumor também é mais freqüente, e na NF1, tumores adrenais bilaterais são freqüentes.
A detecção de tumores múltiplos pode ser problemática, já que, após identificação de um tumor, o médico pode considerar que o diagnóstico foi completo e não identificar um segundo tumor. Alguns autores recomendam que, mesmo após a RM ter identificado um tumor, o mapeamento com 131I-MIBG deve ser feito, tanto por ser mais específico, como para a eventual identificação de um segundo ou terceiro tumor ou para a detecção de metástases (84).
É consenso na literatura, e também a experiência do nosso serviço, que o método mais sensível para a localização do tumor (ou tumores) é a RM. Na nossa casuística, além dos exames já citados, também foi utilizada a ultrassonografia (USG), principalmente no início da década de 70, quando o uso da TC não era sempre disponível e não existia a RM. Esse exame, feito em 54 pacientes, revelou o tumor em 87% dos casos e foi negativo em 7 pacientes, 5 com tumores adrenais e 2 com tumores intra-cardíacos (ecocardiograma transtorácico); em um dos pacientes com tumor intracardíaco, o ecocardiograma transesofágico foi positivo. Portanto, a USG teve um resultado falso-negativo de 13%. A TC, realizada em 66 pacientes, foi negativa em 2 pacientes portadores de tumores intra-cardíacos. Esse exame foi positivo em 97% dos pacientes, 8 deles com tumores extradrenais abdominais, um com tumor no mediatino posterior, um com paraganglioma cervical e o restante com tumores adrenais. Tivemos um falso-negativo de 3%, representado por tumores intra-cardíacos. Freqüentemente observamos tumor de densidade tomográfica heterogênea devido à presença de necrose intratumoral (figura 6). A RM, realizada em 50 pacientes, foi positiva em 100% dos casos. Havia hipersinal nas imagens em T2 em 83%, esse dado era duvidoso em 7% e o sinal não se alterava em 10% dos pacientes (figuras 7 e 8). Portanto, a RM se mostrou superior à TC na identificação topográfica dos tumores, e salientamos a sua positividade nos dois casos de tumores intra-cardíacos. O mapeamento de corpo inteiro com 131I-MIBG, realizado em 40 pacientes, foi positivo em 36 pacientes (90%), resultando num falso-negativo de 10%. O exame foi negativo em dois pacientes com tumores adrenais, em um com tumor abdominal extra-adrenal e em 1 com tumor intracardíaco, e todos eles tinham RM positiva (figura 9). Segundo a literatura, a ocorrência de falsos-positivos no mapeamento é uma eventualidade rara (75,102). Realizamos FDG em apenas dois pacientes com tumores adrenais não metastáticos e este exame foi francamente positivo em um caso e duvidoso em outro. Os nossos dados de sensibilidade dos vários métodos utilizados, TC, RM e 131I-MIBG, são semelhantes aos da literatura (76) (tabela 3).

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