quinta-feira, 16 de maio de 2013
FEOCROMOCITOMA FOI DESCOBERTO APROXIMADAMENTE EM 1924
Aspectos Históricos
da Hipertensão
Nobre F Rev Bras Hipertens vol 7(3): julho/setembro de 2000
Feocromocitoma: aspectos históricos do
diagnóstico ao tratamento
Fernando Nobre*
“In the final analysis, despite our reservations on the interpretation of this particularly puzzling and heretofore unique case, or so we
believe, we would tend to consider all the symptoms of this disease, that is paroxysmal hypertension, the solar and vasocontrictive
crises, the tachycardia and the sympatheticotonic signs as the expression of a state of acute adrenalism caused by the development of a
tumor with characteristics of the adrenal medella”.
M. Labbé, 1922
* Coordenador da Unidade Clínica de Hipertensão – Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto
Universidade de São Paulo.
Feocromocitoma foi a primeira
causa conhecida de hipertensão possivelmente curável.
Frankel descreveu os sintomas e
as alterações anatômicas características do tumor em 1886.
Entretanto, somente 25 anos após
Labbé et al. descreveram-na de forma
completa indicando, inclusive, os
mecanismos fisiopatológicos, nela
envolvidos.
O primeiro tumor ressecado data
de 1927, em um paciente que, inclusive, não havia sido previamente diagnosticado, antes do ato cirúrgico.
Somente dois anos após, em 1929,
é que se pôde indicar uma cirurgia
com o objetivo definido de extirpar-se
um tumor previamente diagnosticado.
Apenas para se situar temporalmente, lembremos que a hipertensão
por obstrução de fluxo sanguíneo
através da arterial renal foi, experimentalmente, proposta em cães em 1934 e
somente demonstrada no homem em
1937.
Com relação ao hiperaldosteronismo primário, entretanto, a sua descri-
ção data de 1955.
Aspecto curioso evidencia a capacidade de observação e o tirocínio
clínico daqueles que descreveram o
primeiro caso de uma garota de 18
anos hospitalizada por perdas acentuadas de peso e acuidade visual.
Em alguns momentos, ela apresentava-se calma e tranqüila, enquanto
em outros agitada, sudorética, pálida,
taquicárdica e com intensa cefaléia,
descrevem os autores.
Continuam, ainda, descrevendo
que sua urina continha abundante
quantidade de proteínas, com fundo
de olho mostrando anormalidades,
compatíveis com o que hoje seria
considerado grau IV.
Ela morreu a despeito da utilização
de todos os recursos terapêuticos, à
época disponíveis, e que eram muito
parcos, concluem os autores.
A descrição termina afirmando que
a necrópsia mostrou um coração alargado, rins macroscopicamente normais, tendo-se encontrado tumores,
em ambas as supra-renais, de aproximadamente 8 cm de diâmetro à esquerda e de 1 cm à direita.
Esta descrição foi feita por Labbé
et al. em 1922, quase 30 anos após a
primeira descrição de Frankel.
Outro caso de interesse foi, à época,
descrito, igualmente por este autor,
tratando-se, agora, de uma mulher de
28 anos, hospitalizada por ataques de
cólicas abdominais, intensa cefaléia,
sudorese, palpitações e vômitos. Durante estes episódios foram registradas
pressões arteriais sistólicas que
variaram de 280 mmHg a 125 mmHg.
Os testes laboratoriais, neste caso,
mostraram presença de proteinúria,
glicosúria e intermitentes elevações
de escórias nitrogenadas.
Um aspecto interessante foi pensado pelos médicos que cuidavam
desta paciente.
Para eles, fazia muito sentido imaginar que, se as crises por ela apresen-211
tadas relacionavam-se, possivelmente,
à uma aguda e profusa secreção de
catecolaminas, a injeção de adrenalina
poderia reproduzir o quadro confirmando suas hipóteses.
Entretanto, após a infusão de 1 mg
de adrenalina, observou-se apenas
discreta elevação da pressão, não superior a 155 mmHg a 165 mmHg, com
discretíssima elevação da freqüência
de pulso.
A evolução desta paciente não foi
menos dramática que a primeiramente
descrita. Após três episódios de edema
agudo, em decorrência de intensas
crises hipertensivas, ela faleceu. A
autópsia revelou um tumor de suprarenal, à esquerda, de 6 cm de diâmetro, concluem relatando, os autores.
Grande mérito deve ser creditado a
Labbé et al., não só por terem identificado, com apurado senso clínico, a
possibilidade da ocorrência do feocromocitoma, mas, especialmente, por
terem apresentado uma perfeita e
coerente fisiopatologia para explicar os
achados de suas observações.
Desde 1895, era conhecido que a
adrenal era produtora de catecolaminas e que estas, quando injetadas
em animais, eram capazes de promover elevações da pressão arterial.
Em 1904, quando Stolz sintetizou a
adrenalina, este fato ficou ainda mais
claramente definido.
Em 1929, Pincoffs realizou cirurgia
de um feocromocitoma, previamente
suspeitado, confirmando a normalização da pressão e a ausência de
sintomas logo após o ato cirúrgico.
Entretanto, somente em 1950, é
que von Euler e Engel mediram as
catecolaminas urinárias, confirmandoas elevadas em pacientes com
feocromocitoma (Quadro 1).
Quadro 1 – Cronologia do descobrimento do feocromocitoma
1986 Frankel descreve a associação de tumor adrenal com o quadro clínico de nefrite e retinite.
1895 Oliver e Schaffer demonstram que a infusão de extratos da medula adrenal promove elevação da pressão arterial em
animais.
1904 Stolz sintetisa a adrenalina.
1922 Labbé et al. descrevem e explicam o paroxismo da hipertensão em pacientes com tumor da medula adrenal.
1929 Pincoffs opera um paciente com feocromocitoma previamente diagnosticado.
1950 Engel e von Euler medem catecolaminas urinárias.
Referências
1. Labbé M, Tinel J, Doumer A. Crises
solaires et hypertension paroxistique em
rapport avec une tumeur surrénale. Bull
Soc Med Hôp 46: 982-90, 1922.
2. Frankel F. Ein fall von doppelseitigem,
völlig latent verlaufenen nebennierentumor und gleichzeitiger nephritis mit
veränderungen am circulationsapparat
und retinitis. Virchow Arch Path Anat
103: 244-63, 1886.
3. Picoffs MC. A case of paroxysmal hypertensio associated with suprarenal tumor. Trans
Assoc Am Phys 44: 295-9, 1929.
4. Oliver G, Schäfer EA. Physiological
effects of extracts of the suprarenal
capsules. J Physiol 18: 230, 1895.
Nobre F Rev Bras Hipertens vol 7(3): julho/setembro de 2
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